terça-feira, 3 de abril de 2012

Oi, você quer ser meu amigo!?



A maior desvantagem de mudar é deixar amigos para trás. E por mais que o mundo tenha diminuído com as múltiplas possibilidades da internet, chats no skype jamais substituirão almoços sem hora para começar ou terminar, andanças indefinidas, idas de última hora ao cineminha, cafezinhos de fim de tarde, bebericos de começo de noite, e todos os múltiplos programas que inventamos só para contarmos, escutarmos e compartilharmos a vida com essas criaturinhas indispensavelmente adoráveis que adotamos como “irmãos camaradas”, de acordo com a definição do Rei Roberto e seu, claro, amigo Erasmo.
É dureza aterrissar em cidade nova e desconhecida e não ter conhecimento de seu ninguém! Eu e marido sentimos falta dos que nos fazem falta e procuramos, com afinco, preencher esta ausência que se instalou em nossas vidas. Ocorre que nas nossas tentativas de recapear o buraco da amizade, tem aparecido de tudo um pouco, mas tudo bem porque, no final das contas, somos maleáveis, esclarecidos, tolerantes, virginianos, compreensivos... até chegarmos ao nosso limite ou eu chegar ao meu!
Antes de mudar, fui recomendada por uma amiga querida a uma outra amiga dela, que morava na região. Com a segurança de quem conhece a minha causa, garantiu que eu e ela tínhamos tudo para nos transformar nas mais novas BFF’s da década. Troquei e-mails mil com a moça, planejamos encontros e apresentações, até que ela me informou que estava de partida para a Espanha, justamente no mesmo mês em que eu chegaria... E lá se foi a minha BFF...
Como seguia carente, mantive amizade virtual com a moça que, sensibilizada com a minha causa, resolveu apresentar-me, virtualmente..., às suas amigas ainda residentes na área. É que eu demandava muito e ela não tinha resposta para toda a minha enquete: cabeleireiro, sobrancelha, unha, depilação...
E foi aí que fiz amizade virtual com as amigas da minha amiga virtual. Mandado o e-mail introduzindo-me ao grupo, a adesão à minha causa foi um sucesso! Tenho o telefone de todas as cabeleireiras, depiladoras, manicures e até banqueteiras sul americanas que perambulam pela área. O chato foi que as minhas tentativas de “desvirtualizar” a relação não deram muito certo... Não sei se por ter sido dezembro, o que sei é que a argentina estava a caminho de Buenos Aires, a mexicana de partida para Guadalarára e a brasileira, trabalhadeira, muito ocupada. Ficou nisso e ninguém necas de pitipiriba para a minha pessoa. Mas, cheguei à conclusão de que foi melhor assim, ou me sentiria em um blind date da amizade, esperando a gazela em um café helvético, com uma rosa na mesa para que ela me reconhecesse. Saco!
Ocorre que os dias foram passando e o desespero pela amizade fazia com que enxergasse um potencial amigo em todo e qualquer transeunte. Foi assim com a colombiana que me vendeu um pisante. Simpática como só os do lado americano do hemisfério sul sabem ser, entabulou um portunhol comigo que não teve mais fim. Contou-me toda a vida em cerca de meia hora e pediu, urgentemente, para que trocássemos e-mail, pois assim poderíamos, qualquer dia desses, tomar um café. Fiquei tão feliz! Dei prontamente o meu e-mail, mas... caindo em mim, pensei: o que sei dessa cidadão!? E se ela for uma louca, psicopata, sapatona e/ou ladra de maridos!? Na dúvida, joguei o papelzinho fora...
Para falar a verdade, temos um só, filho único de mãe solteira, amigo, que trabalhou com marido na África do Sul e, assim como nós, para cá também seguiu. Ele também sofre para fazer novas amizades (não preciso falar que suíço não é exatamente o povo mais caloroso e receptivo do mundo, preciso!?) e pensando em incrementar a vida social, resolveu aderir a um time de rúgbi com quem costuma sempre sair. Convite feito para a baladinha logo mais à noite, fomos lá ver o que nos aguardava e conhecer os potenciais amigos.
Em meio a meninos grandes - ou nem tão grandes assim, já que um deles era um argentino que batia no meu ombro, dando-me a sensação de que eu também poderia jogar rúgbi - cheio de tatoos e arrotos pós cerveja ainda maiores do que eles, não rolou empatia nenhuma ou, se quer, uma troca de palavras, e assim voltamos para casa possuidores do mesmo amigo único de sempre.
É verdade também que marido não deu lá muita sorte no quesito simpatia e camaradagem entre os colegas de trabalho, o que torna ainda mais penosa a busca pelo verdadeiro e leal amigo. De qualquer forma, foi com esperança no coração que, também em dezembro, nos dirigimos ao jantar de final de ano da “firrrma”, afinal, há sempre uma chance das coisas mudarem em um ambiente descontraído! Mas, aonde estava a descontração!? Onde ela foi parar ou se esconder!? Assim que cheguei, lembrei dos almoços de final de ano da minha lendária “firrrma” de “adevogados”, onde trabalhei com a Juju: ninguém tinha nada a ver com ninguém e as pessoas só estavam ali, nitidamente, para cumprir o dever e a obrigação de celebrar com os que passavam o ano inteiro meramente aturando e tolerando.
Esse era o clima da ocasião e foi com ele que sentamos na primeira mesa avistada com dois lugares sobrando, em meio a pessoas que marido, recém chegado na “firrrma”, conhecia um pouco melhor do que as outras. Na verdade, eu tinha um target a atingir: o alvo da minha amizade era uma mexicana, também advogada, que como eu tinha acabado de chegar acompanhando o marido, aprendia francês e fazia o tal LLM que havia me interessado. Estava ansiosa para conhecê-la, porque, afinal, tínhamos coisas em comum, até que ela adentrou triunfalmente no recinto, sorridente, bonitona e “maquilada”, corpulenta e de cintura fina, no melhor estilo latina caliente de novela, naturalmente, mexicana, do SBT... Não foi dessa vez que o santo bateu e assim mudei rapidamente de alvo.
Sobrou-me, então, vasculhar a mesa de semi-conhecidos de marido. Do nosso lado, sentou-se um casal cuja vertente masculina enchia os ouvidos de marido até marido sorrir amarelo e não mais disfarçar a sua falta de atenção. O tal moço, com cara de ratinho engomado pela avó, gabava-se da época em que tinha sido expatriado em... Madagascar (acho que ele era um personagem do desenho animado...), encontrando respaldo para tudo o que falava na vertente feminina do casal, que tinha a forma de moça grávida do segundo filho, linda, jovem, mas com um jeitinho de - não posso encontrar melhor definição do que a que damos em Recife - “abestalhada”, sorrindo, resignada, com a sua condição de esposa de expatriado que, por morar pelo mundo afora (Madagascar + uma cidade minúscula na Suíça...) não viu outra alternativa para a sua jovem vida a não ser desistir de qualquer espécie de carreira, trabalho, emprego; criar e gerar filhos; e participar de um clube para o qual ela, animadamente, convidou-me a frequentar e, prontamente, anotou o meu telefone em um bloquinho de papel rapidamente sacado da sua bolsa, para que assim mantivéssemos contato e pudéssemos ir juntas ao tal clube.
Calma, que o clube merece um parágrafo próprio... Clube ou confraria, é um local onde as esposas de executivos expatriados se reúnem semanalmente para, aspas dela e parênteses meus: “cozinhar! nós trocamos receitas (jesuise!) e cada semana uma faz um prato diferente!”; “bater papo! as italianas, passam a tarde fumando e falando (provavelmente, mal, dos maridos que as colocaram nessa enrascada...) sem parar!”; “aprender uma nova língua, já que tem mulheres do mundo todo (imagino a fluência e a verborragia do encontro...)”.
E para finalizar o relato, o ratinho marido completou: “É, lá eles fazem de um tudo para manter a mulherada ocupada!”
Enquanto ela ia me falando todas essas coisas, eu fui entrando num estado de confusão mental e quase choque porque nunca imaginei na vida, que um lugar como esse existisse. Deu até uma vontadezinha de chorar, só de me imaginar fazendo uma comidinha em meio a desconhecidas faladoras de todas as línguas do mundo.
Juro que não sabia o que dizer e que a única coisa que pude fazer foi... rir amarelo e dar o meu telefone para ela dizendo que sim, seria “ótimo” passar uma tarde com “elas”...
Do meu lado, havia sentado uma fêmea de outra “catigoria” do tipo, digamos, “gente como a gente”, que também escutou ao relato perplexa e que, vendo a minha cara de desespero, segurou o meu braço, tomou um bom gole de vinho, olhou-me com seriedade e disse “you better find a job!”, eu só pude concordar (sem nunca ter discordado!) e pedi, a ela, solteira e simpática que, por favor, quando você tiver alguma coisa para fazer, você me chama!?
Acho que o meu desespero foi tão aparente que, em menos de uma semana, ela me convidou para conhecer duas outras amigas, em um happy de meninas. Fui eu lá, sozinha e destemida, com todo o apoio de marido, em uma noite fria e chuvosa, sem saber o que me aguardava. Encontrei mais duas da categoria “gente como a gente” e diverti-me muito com elas naquela noite. Com uma delas, ainda encontrei depois para um café, mas... é todo mundo ocupado, corrido e eu, a toa, fico sem graça de impor a minha presença no grupo, afinal, passados alguns e-mails sem retorno, insistir no encontro é entrar na mendicância da amizade...
Dei um tempo, juntei forças e aí chegou janeiro, renovando a esperança! Começaria o curso de francês e tive o cuidado de escolher uma escola com pessoas mais velhas, que morassem, de fato, por aqui, saindo fora da cilada que seria entrar em um daqueles cursos de férias, cheios de adolescentes estrangeiros que, como eu já fiz um dia nessa vida, inventam que querem aprender uma língua só para passar as férias na Europa. Dá licença, mas eu não estou de férias, estou a serviço e a minha missão é fazer amigos!
Começado o curso, deu para ver que a minha - falta de - sorte com os amigos da “aulinha de inglês”, não tinha mudado muito. Lembro bem que quando passei dois meses brincando de estudar italiano em Firenze, tive a opção de escolher se queria me hospedar em uma casa sozinha ou com outros estudantes. Escolhi, lógico!, com outros estudantes, pois assim incrementaria a minha chance de fazer amigos, o que não foi o caso, ao menos não em casa: o meu “amigo” era um senhor de 62 anos, por ironia, suíço e antipático, que passava as tardes observando obras de arte com um binóculo e comentado-as durante o jantar, enquanto eu, aos 21, passava as mesmas tardes enchendo a cara de birra na fontana mais próxima com os amigos que, ufa!, havia feito em lugar outro, e sempre chegava atrasada para o tal jantar, tendo que agüentar a cara feia dele e da dona da casa.
Bom, fato é que agora os tempos são outros e, ao invés de cerveja na fonte, eu tomo vinho em meu sofá creme, enquanto lembro que o curso de francês não foi a fonte inesgotável de amizades que eu imaginei. Entre um lituânio que eu julgava alemão e uma suíça-alemã que eu julgava britânica - por pura falta de compreensão do sarapatel de sotaques que foi a nossa apresentação em francês, no primeiro dia de aula - a “liga”, ingrediente fundamental para a amizade, não “se deu” com eles, nem com a americana que desistiu do curso no meio do caminho, a australiana que vive em outro planeta e a japonesa que entra muda e sai calada, mantendo contato apenas com o seu pad.
Não posso negar que a suíça-alemã tenta, e muito, ser minha amiga. Um dia, até pensei em tomar um cafezinho de final de tarde com ela, mas, o que exatamente conversarei com uma menina de 16 anos!? (Pois é, não falei da sorte com os amigos da aulinha de inglês!? Tive o cuidado de escolher um curso noturno, supostamente freqüentado por adultos, e termino com uma coleguinha adolescente...) Ela tem 16, é um gordinha simpática de bochechas rosadas no melhor estilo ar-saudável-dos-Alpes, e sempre me acompanha no final da aula até a estação de trem. Quer aprender francês porque - quando crescer... - pretende trabalhar com turismo e hotelaria. Foi por isso que decidiu passar esse ano em Lausanne, onde estuda francês à noite e trabalha durante o dia como uma espécie de governanta em uma casa de família que a hospeda (aliás, por aqui, isso é bem comum entre os teens que querem aprender uma língua e reduzir os custos da viagem). Ela é originária de uma cidadezinha minúscula da Suíça alemã e considera Lausanne uma cidade grande. Jubila de excitação e rebeldia ao atravessar a faixa de pedestres quando o sinal ainda está vermelho para os transeuntes, uma atitude que toma como transgressora (em Lausanne, parte francesa, eles ainda fazem isso, mas, pelo visto, na alemã, nem pensar...) e, outro dia, veio, desesperada, perguntar-me o que fazer porque um homem estranho e mal encarado havia sentado ao lado dela no trem, puxado conversa, perguntado o nome e o telefone dela e ela, com medo de não falar e sofrer alguma espécie de ataque ou perseguição, deu (!!!!), e agora o mal encarado ligava para o “cel” obstinadamente. Primeiro, disse que ela não deveria falar com estranhos (essa é básica, não!?!?!?!), segundo perguntei se ela não sabia mentir, e ela ficou mais vermelha que pimentão. Pelo jeito, não...
É, a empreitada da amizade não tem sido fácil! Fato é que, agora em março, com a primavera florindo na minha porta, eu desisti de insistir no tema. Eles aparecerão quando tiverem que aparecer e ponto final! Descobri que 1) ando com muita preguiça de gente nova, de forçar amizade e começar do zero com pessoas que não me dizem nada, provenientes de lugar nenhum; 2) já fiz amigos para toda uma vida e com eles conto sempre, nem que seja via skype, e-mail ou por este blog para o qual nunca escrevi um post tão longo (perdão!), portanto, prefiro mantê-los à distância do que angariar novidades... De qualquer forma, sigo tentando... Por sinal, preciso marcar um café com o meu próximo prospecto de amigo, dessa vez, indicado pelo meu pai: trata-se de um padre, sacerdote católico, que mora há 25 anos em Lausanne e que o meu pai conheceu em janeiro, em Jurerê Internacional. Pitoresco, não!? Se não rolar amizade, ao menos vira uma boa estória para ser contada por aqui...

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